Entre a vida e a morte

A morte nunca foi uma opção, nem para mim e nem para meu bebê.
Você sabe qual é o significado do nome Matheus? Mateus significa
“presente de Deus” e vou te contar aqui a história de porque o fotografo desta
matéria tem este nome.
Em fevereiro de 1995, meu marido e eu decidimos ter mais um filho. Já tínhamos o
Diego, com dois anos de idade, e queríamos ter o segundo. Tirei o DIU para poder
engravidar e então, senti um nódulo no meu pescoço e procurei meu ginecologista em São Paulo, onde eu morava na época, para saber o que poderia ser. Ele ficou com medo que fosse mononucleose e me encaminhou
para realizar todos os exames.
Quando fiz o exame de sangue, constatou que eu já estava grávida e que estava com algum
problema de saúde, mas não conseguia apontar o que era. Começamos a investigar. Os exames
revelaram que estava com alguns nódulos na tireoide – não um, nem dois, mas alguns. Lembro-me bem
que a médica que realizou os procedimentos me perguntou se eu já tinha outro filho, respondi que sim
e ela, então, disse “que bom, pois esse você não vai poder ter”. Foi de uma insensibilidade desumana.
O resultado revelou o que mais temíamos: que eu estava com câncer de tireoide já bem avançado
e deveria realizar uma cirurgia urgente para retirada dos nódulos. Meu ginecologista não
deu opções; disse que se mantivesse a gravidez, correria risco de vida e que, portanto, era melhor
interromper e tratar. Esse foi o conselho dele e de toda a minha família.
Mas não me entreguei.
Para mim, a morte não era uma opção. Nem a minha e nem a do bebê.
Não sou religiosa, mas sim uma mulher de fé – e sabia que Deus não estava me dando este desafio
para eu perder.
Tomada por uma sensação enorme de coragem, procurei outros médicos e por indicação de uma
amiga – que tinha tido problemas de tireoide anteriormente – busquei um Endocrinologista em São
Paulo: o doutor Reinaldo Furlanetto. Ele explicou tudo e disse que o câncer de tireoide não era dos
piores, que poderia esperar até o terceiro mês da gravidez para operar e fazer a quimioterapia logo após
o nascimento; que o único risco era eu abortar naturalmente durante a cirurgia, por conta do seu tempo
de duração. Me incentivou e disse com todas as letras de que era seguro fazer isso e nós optamos
por fazê-lo.
Fiz a cirurgia com quatro meses. Mantive a gravidez.
Matheus nasceu em 7 de novembro 1995, perfeito e saudável. Minha primeira pergunta foi se ele
tinha todos os dedos. Era isso que me preocupava: a saúde dele, pois eu havia tomado muita medicação
durante o período gestacional.
Em janeiro de 1996, me afastei dos meus filhos para fazer tratamento com o iodo radioativo.
Precisei ficar 40 dias longe deles e isso, sim, foi difícil – mas pude contar com minha mãe e marido, para
que cuidassem deles.
Agradeço todos os dias por ter engravidado dele e assim descoberto rápido o que eu tinha, ter me
tratado e me curado. Seu nome significa “presente de Deus” porque ele veio não somente para encher
minha vida de luz, como para salvá-la. Sou grata por ter criado esse homem, a quem tenho orgulho de
chamar de filho, e que, além de tudo, é um fotografo maravilhoso e fez a foto desta matéria.
Desde o primeiro dia falei: “vamos vencer esta luta, nada e nem ninguém vai nos impedir de
trilhar esta aventura chamada vida, juntos”.
Todos os anos faço exames de rotina e uma vez ao ano faço uma ressonância magnética do
pescoço para controlar dois nódulos que ainda estão lá dentro, mas são inalcançáveis para fazer pulsão.
Então controlo o tamanho deles.
Aprendi com a experiência que quando a vida te dá um presente como esse, você deve, além de
agradecer, retribuir. Sendo assim, me engajei no trabalho voluntário e tento ajudar o próximo da melhor
maneira que consigo. O “Brazilian Voices”, grupo vocal aqui da Florida, apareceu na minha vida para eu
poder retribuir com alegria, e cantar para pessoas que estão em tratamento de câncer.
Nunca devemos dar poder para a dor que estamos sentindo. Você tem que lutar com todas as
forças para superar o momento e sair no final do túnel, pois no final sempre há luz.
A arte de viver está no encarar a morte como um desafio de não chegar nela.
A experiencia de fazer a foto para esta matéria com o Matheus foi mágica, uma verdadeira conexão de
almas que estavam fadadas a trilhar juntos esta aventura chamada vida, me ver aos olhos dele me
“retratando” me fazem ter a certeza de que tudo valeu a pena. A luz que me ilumina vem dos olhos
dele.
Luciana Dal Santo Lewis
Fotografo: Matheus Dal Santo Lewis ( filho da Luciana)
Por Luciana (Lu) Lewis
